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O mundo da Ch@p@

Interactividade

A.N, 28.02.07



O envelope azul a piscar, os emails que dão alento, os comentários que timidamente, não são partilhados, mas chegam ao destinatário.

Os comentários menos tímidos que aquecem as manhãs.

O café da manhã servido em Campolide com panquecas de Utrecht.

E assim o Mundo deixa de ser meu e passa a ser de todos!

Fim da aventura

A.N, 28.02.07



Num piscar de olhos, os seis meses voaram.

O que ao principio se revelara ser a experiência mais conturbada da jovem existência, revelou-se, à semelhança de todos os que passaram pelo mesmo, ser o ponto de viragem do percurso daquela pessoa.

Nada será igual ao que tinha sido, pertencia agora ao clube privilegiado daqueles que um dia trocaram (puderam trocar?) a pacatez da suas casas pelo desbravar de outras vidas.

A aventura chegou ontem ao fim, acompanhada de malas toscamente arrumadas, de fotografias aleatórias e pedaços de papel na carteira que provam os lugares percorridos nos últimos meses.

A última caminhada nas ruas que agora já eram dele; os abraços fortes e a certeza (ilusória?) inabalável de que, em breve, se reencontrarão; as correrias de última hora; os pertences que deixa esquecido na casa que será sempre dele.

Sem dar-se conta, tudo ficara abalado, os seus alicerces renovaram-se e a sua perspectiva do mundo também o fizera.

Quatro anos passaram desde o dia em que foi a minha vez de caminhar, pela última vez e enquanto residente, as ruas sujas da “minha” (nossa?) cidade.

Na memória ainda sinto o cheiro húmido e o calor abafado dessa noite; da angústia e a da incerteza; da tristeza profunda que até àquela data não conhecia.

A subida penosa da Layetana, depois do jantar no Borne, do choro compulsivo ao passar a entrada do metro da Urquinaona, do desconsolo de ver as malas empilhadas junto à porta da casa vazia, das recordações que os que já haviam partido deixaram e da fugaz ida até ao aeroporto, ainda de madrugada, que ainda assim me permitiu ver, pela última vez, a minha cidade ainda meio adormecida que já se preparava para o iniciar de um novo dia, lembrando-me, delicadamente, que a vida continua.

A chegada a Lisboa foi, igualmente, inesquecível, mergulhada num misto de alegria e desolação, certa que aquele capítulo se encerrava naquele momento e que jamais coisa alguma se assemelharia.

Ontem, ao vê-lo chegar, recordei-me há quatro anos atrás e por momentos reconheci-me, outra vez .

Pela primeira vez, esbocei o sorriso de compreensão que tantas vezes vi naqueles a quem relatei a minha experiência e que já haviam passado pelo mesmo. A vontade foi correr a consolá-lo, mas os homens não se emocionam, não dão parte fraca ,não é verdade?

Voltou, ontem, a nostalgia, o nó incomodativo no estômago, a saudade.

Mas, ao mesmo tempo, voltou a gratidão, a alegria e a convicção acérrima de que esta aventura será, certamente, um dos tesouros mais preciosos que levaremos connosco quando partirmos.

E, vendo-o dessa perspectiva, a aventura nunca chega ao fim.

Óscares 2007

A.N, 26.02.07



Longe vão os tempos da expectativa dos Óscares, do “glamour” das chegadas ao Kodak Theatre, dos palpites infrutíferos e da luta de titãs entre o sono e a curiosidade, a espertina de Domingo e as antecipadas olheiras de segunda-feira.

A Academia perdeu, igualmente, a aura de admiração que, candidamente, lhe atribuía e a vida dos seus personagens, esmiuçada e esquartejada pela imprensa do coração pouco ou nada têm de secreto.

A Academia, afinal, não passa de um lobby ( ou um grémio, como o nosso ditador lhe poderia ter chamado), um ninho de protectores e protegidos, onde as escolhas são politicamente pensadas, delineadas e consideradas à boa moda americana.

A noite de Domingo terminou antes da chegada dos mais pontuais e a manhã de segunda-feira, pese embora a ausência da aura de mistério, começou com a corrida frenética ao rádio para ouvir quais as decisões dos grandes de Hollywood.

A aplaudir? O laureado “Little Miss Sunshine” , provavelmente o melhor filme que vi em 2006.

A surpresa? Scorsese, finalmente, a cair em graça perante os Deuses do Olimpo californiano

O momento? Martin Scorsese: “ Thank you. Thank you. Could you double-check the envelope, please?”

Gone with the wind

A.N, 20.02.07
Duas semanas.
Post its na despensa, casa de banho, soalho da sala.
Duas insónias, muitos episódios de Prison Break, Grey´s Anatomy and Ally McBeal
Centenas de músicas no itunes.
Frigorifico vazio.
Gavetas que aguardam arrumações.
Três fissuras, duas zonas manchadas de humidade, barulhos constantes na casa dos vizinhos.
A vida, sem mim, em minha casa.

...

A.N, 20.02.07
Não existem pessoas más, repetia vezes sem conta durante os exercícios de meditação que a Aurora lhe tinha recomendado.
O caminho passava por acreditar na pureza de sentimentos, na irrelevância da maioria das acções e na razão individual dos indivíduos.
A mesma razão que, teoricamente, os impede de optar pelo mau quando o bom está à mesma distância; pelo destrutivo quando a conciliação é a solução mais equitativa; pela saída que não lhes trará , a longo prazo, quaisquer benefícios para além da satisfação efémera das decisões egoístas.
Valores morais que admirava, mas a faziam sentir ingénua, vulnerável, errada.
Os exercícios traziam-lhe calma, exigiam concentração, mas não o conforto que procurava. Se a lógica que lhe exigiam era a opção responsável e a prevalecente, porque é que as ironias da vida lhe ensinavam que nada havia a mudar nas suas atitudes irreflectidas, pois o rumo dos acontecimentos não lhe competia?
Via os outros sorrir e tudo parecia estar sempre bem.
A ordem natural das coisas aplicava-se-lhes, caindo-lhes de feição como um vestido à medida. O seu trajecto, porém, apresentava-se mais conturbado, com curvas mais sinuosas, com entroncamentos que exigiam cautela.
O barulho do gato da vizinha despertara-a do transe. Sentia as pernas entorpecidas devido à posição na qual permanecera durante duas horas.
Na rua, o sol já espreitava tímido, tingindo de dourado as folhas perdidas no jardim.
Desligou a música, atiçou o fogo da lareira e esperou que a sensação de alheamento lhe permitisse regressar ao ambiente da sala.
Apesar das dúvidas, o conselho de reflexão de Aurora surtia efeito.
Não iria mudar, sabia-o, mas sentiu-se, pelo menos naquele instante, mais apta a aceitar.

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