Quando mentiu acerca da existência de armas químicas no Iraque, a comunidade ocidental tratou-o com benevolência. Aliás, tratou o elo anglosaxónico de Bush e Blair com uma brandura que quase que se confundiria com a resignação duma mãe cansada, ao ver o filho repetir asneiras com a mesma energia e determinação com que as havia cometido pela primeira vez. Talvez porque fosse tarde demais evitar o que quer que seja. Afinal, a Guerra já tinha começado e não esqueçamos que Saddam era o ditador desrespeitador dos direitos humanos e da cultura democrática de que tanto nos orgulhamos. Parar para pensar se o modelo democrático era o adequado para o Iraque ( independentemente de funcionar connosco) ou numa reestruturação política para o Iraque no pós-guerra, colocando-se a questão de saber se Xiitas e Sunitas poderiam conviver em equilíbrio de forças , exigia um esforço mental demasiadamente complicado para todos nós. Imagine-se então o quão exigente este raciocínio seria para Bush que, aparentemente, é incapaz (ou se recusa!) de pensar a longo prazo, dedicando o seu tempo a actividades muito mais relevantes, como jogar golf no seu rancho no Texas. Comprovadamente demonstrado que o homem não tem um QI elevado, restar-lhe-iam a humildade e a seriedade, como escapatória da sua mediocridade e meio de afirmação e admiração perante os demais. Porém, o pastor do Mundo Ocidental não possui nenhuma destas duas virtudes, nem procura adquiri-las. E quando Bush espirra, todos nós ficamos de cama uma semana. E quando Bush mente à comunidade internacional, encolhemos os ombros com desanimo e o Congresso aplaude. E quando Bush mente à sua própria gente, deixando-os à mercê do Katrina, ainda que previamente avisado da ruptura inevitável dos diques de New Orleans, imagine-se então o que fará aos que não penduram a bandeira americana na porta das suas casas?
Depois do campo seguiu-se a praia e todos os prazeres que lhe estão inerentes, à excepção, claro está, do sol e do calor, uma vez que o Inverno não faz tenções de abandonar o Algarve tão cedo. Longe do Carnaval de Loulé e das anafadas translúcidas que tentam enganar o frio do carro alegórico com falsos movimentos de samba, em Lagos reinava a calma dos pequenos almoços na varanda, acompanhados do inigualável sumo de laranja algarvio e daquele cheiro a fruta e humidade que nos enche os pulmões à chegada e me faz afirmar, satisfeita, “Cheira a Algarve”. O cenário é simplório: três livros na cabeceira, jornais amontoados no chão e revistas cor-de-rosa e de hoje e de há dois anos ( impressionante como são sempre legíveis este tipo de revistas. Se não nos actualizamos do estado de graça de Catarina Furtado, que a crer no que os media divulgam parece ser a única mulher do planeta a dar à luz, sempre podemos obter detalhes escabrosos do final do seu namoro com João Gil há três anos atrás, imortalizados numa Caras amarelada e com vestígios de areia que a mãe deixou no saco da praia, pendurado, tristemente, na despensa até que o calor se volte a sentir.) Entre estados letárgicos misturo a OPA da Sonae com o recente namoro de Miguel Beleza e Alberta Marques Fernandes, analiso a decisão do Tribunal em permitir a apreensão dos computadores dos jornalistas do 24 Horas e o subsequente recurso (sem efeito suspensivo?); navego, pela mão do Perez-Reverte, até às costas de Cartagena e ao Cemitério dos Barcos sem nome, analiso prós e contras dum plano nuclear que, apesar de não se incluir na agenda do Governo, todos parecem querer debater; misturo o H5n1 com o H5n2 sem conseguir destrinçar, ao certo, qual a forma de evitar o contágio; tomo conhecimento que Julião Sarmento expõe em Londres e fico a saber que a Fátima Lopes (estilista) jamais teria alcançado sucesso, caso tivesse sido mãe. E na hora de regressar à capital, onde a rotina exige a minha presença, volto com o sono em dia e a leitura actualizada em todas as vertentes da sociedade. A preguiça ainda é muita, pelo que uma análise pessoal acerca da informação adquirida, parece-me demasiado complicada. No entanto, há uma conclusão que me permito retirar: nada como uma escapadela da cidade para arejar a mente. Ainda que com chuva, com frio e maus programas televisivos (vide Prémio Estupidificação), o meu Carnaval sem samba passou-se muito bem!