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O mundo da Ch@p@

Pausa...

A.N, 28.06.06



Aparentemente há vida para além das paredes imediatamente em frente à minha secretária.

O sol voltou, a temperatura ameaça subir e felizardos há que já se podem esparramar, descontraídos, na praia, deixando os neurónios a marinar até Setembro.

Quando o curso terminou, julguei que jamais voltaria a saudar Julho com aquela ligeira enxaqueca ansiosa; que jamais teria que voltar a rotina dos dias inquietantes de reclusão, à espera do desconhecido.

Apesar de inconscientemente saber que todos nós somos avaliados diariamente através de cada acto, palavra e inclusivé de cada omissão que nos permitimos, submeter-nos a um teste causa sempre desconforto e temor.

Principalmente quando os critérios não são justos, os avaliadores são humanos e, consequentemente, não são isentos ou infalíveis, quando os conhecimentos adquiridos ao longo do estágio não obedecem a padrões homogéneos, quando se pretende avaliar aptidões profissionais num único dia, sob pressão e sem uma qualquer limitação da matéria a avaliar.

Parte boa: a música, os jogos do Mundial, o ligeiro “Memoirs of a Geisha” para ler no final do dia, como contraponto do Código de Processo Civil.

A má?

O risco de em Setembro, dois anos após a entrada no mundo laboral, ver-me novamente enclausurada e a brincar ao faz-de-conta dos estudantes.

Desconcentração

A.N, 25.06.06



Coça os pés, lê duas linhas e suspira.

Tem fome; tem sede; tem sono e dores musculares.

Toma notas, risca notas, sublinha, escrevinha.

Aos poucos a sua caligrafia torna-se indecifrável, mas não se importa: no momento crucial saberá entender os seus hieróglifos.

Vê os mails, explora os cd´s, espreita os blogs e roí as unhas.

Marca as páginas com “post it” e divide o dossier com separadores.

Pensa no futebol, na avó, nas séries do canal dois, nos telefonemas que ainda não fez, nas férias que tardam em chegar.

Não faz tanto quanto devia e tem consciência disso.

Dói-lhe o estômago por causa da ansiedade e sente as primeiras ameaças da eminente enxaqueca.

Mesmo após decorridos tantos, tem consciência de que ainda não aprendeu a estudar.

E , logo agora, que se começava finalmente a concentrar, é hora de jogo e Portugal tem que ganhar.

Não importa. Amanhã as coisas vão correr melhor... certamente...

Suspira.

Fecha os livros e vai lanchar!

Acta da Assembleia

A.N, 21.06.06

Não se apresentaram com um nome fictício, nem assumiram, sem pudores, que tivessem um problema a partilhar com os demais.

Tinham, no entanto, vários problemas comuns e esse era o motivo que os levou a reunir naquela noite.

Só se alcançaram os 25% exigidos para o quorúm, uma hora e meia depois da hora marcada.

Uns chegavam curiosos, atónitos perante a sala de condóminos que ainda não conheciam.

Muitos, porém, faziam-se acompanhar de relatórios de contas, lista de sugestões, canetas e calculadoras.

Como não poderia deixar de ser, iniciaram-se os trabalhos com as declarações exaltadas e sanguinárias de uma das condóminas.

Tal como sucede em qualquer assembleia de condóminos em qualquer edifício do mundo, procurou-se durante largos minutos, através da partilha da terapia de grupo, debater os problemas e apontar o dedo a terceiros, sem qualquer tipo de pragmatismo na busca de soluções eficazes perante as contas negativas do condomínio ou a quase aceitação tácita dos condóminos perante a transformação da piscina privada em municipal.

Tínhamos, portanto, o Sr. Contabilista, obcecado com os desvios do fundo de reserva comum e as discrepâncias entre o orçamento apresentado para 2005 e os gastos reais; a senhora indignada que pedia a afixação pública da lista de devedores das participações comuns, provavelmente e a julgar pelo seu olhar tresloucado, seguido de um linchamento por parte da Comissão de Acompanhamento.

Ao fundo da sala encontrava-se o Certinho-Direitinho, defensor dos insectos e da flora circundante ao prédio que sugeria a contratação de um salva-vidas para vigilância da piscina dos pequeninos, desconhecendo, este pobre Diabo, que crianças quase não têm espaço na sua piscina, na medida em que todos os fins-de-semana os King Kongs de Campolide e arredores, juntamente com as suas igualmente encantadoras GI-Janes, ocupam orgulhosa e languidamente aquele seu tanque, com as inevitáveis e estéticas tatuagens, latas de cerveja e cinzeiros!

Estavam igualmente presentes as senhoras dos andares térreos que, fazendo jus às suas preferências, se uniram na linha da frente da sala, redundando nas suas exigências de “soluções integradas” por parte da Administração e encontraram naquele sinistro encontro, uma forma diferente de passar as suas noites solitárias.

A animar a discussão, o “queque” sem papas na língua que, de forma atabalhoada e demasiado corriqueira, dizia em voz alta o que todos pensavam, mas temiam dizer.

A Administração, despreocupada e com uma evidente falta de preparação técnica, defendia-se das pedras arremessadas por este grupo de pessoas que renunciou ao sofá para procurar soluções para o “bem comum” que de comum não parece ter muito, uma vez que 75% dos condóminos se encontravam ausentes.

Last but not the least, a “jurista”, escondida na última fila e alheia às disposições legais entediantes que regulam o condomínio, perdia-se em análises psicológicas daqueles seus vizinhos que, da mesma forma que pregavam em defesa do que “é nosso”, a atropelam praticamente todos os dias na garagem e fingem não vê-la quando se cruzam nos corredores.

Por unânimidade, encerraram-se os trabalhos perto da uma e um quarto da manhã.

Que se faça constar em acta.

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