"Acusavam-na de não ter lido todos os grandes clássicos e de não ter expostos, na estante, os principais troféus da literatura contemporânea.
Questionavam os recém adquiridos exemplares que ela, cuidadosamente, escolhera para a leitura de verão.
Livros condenados a folhas dobradas e a vestígios de protector solar; livros que anos volvidos guardarão, certamente, areia entre as folhas e cheiro a maresia.
Os livros, tais como os amigos, são para as ocasiões, pensava.
Cada qual tem o seu momento especifico, o seu contributo e a sua própria vivência.
O lugar que ocupam, não se restringe à prateleira, mas a uma fase especifica, a momentos de abstracção peculiares, a interesses e curiosidades momentâneas.
Não lera todos os grandes clássicos, é verdade.
Mas também não conhecera todas as pessoas que deveria.
Lera, porém, muito mais que muita gente e conhecia de cor a satisfação do regresso a casa, com os dedos vincados pelos sacos que transportam a literatura dos seus dias.
Os livros obrigatórios seriam lidos. A seu tempo, no devido compasso de espera.
Até lá, observaria o alinhamento dos seus romances e novelas, as lombadas das suas aquisições e ofertas, a desorganização de autores a que votava a sua biblioteca.
E um dia, quem sabe, o seu nome figurará na biblioteca de alguém que partilha a mesma paixão."