Esclarecem-se os senhores leitores:Sim, é verdade. É sexta-feira à tarde e estou amarga.
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Há coisas que eu não entendo nos debates quinzenais do Primeiro Ministro na Assembleia da República.
Desde logo a presença de todos os ministros que mais não fazem do que acompanhar o funeral enquanto Sócrates usa e abusa da arte da retórica, para dizer o mesmo de sempre e camuflar, muitas vezes, o óbvio.
Se bem que sempre ouvi dizer que quando um burro fala, os outros baixam as orelhas, parece-me que a forma demasiado condescendente com que Sócrates tratar os seus “meninos”em nada abona em favor destes que ali jazem, inertes, submissos ao silêncio para não sucumbir à ignorância; temerosos do juízo do paizinho que não faz por disfarçar a descrença nas capacidades dos seus rebentos.
Por outro lado, não concebo democracia mais decadente do que a nossa, uma vez que ao invés de ideias, projectos e intervenções na vida social, desperdiça tempo, energia e dinheiro dos contribuintes a discutir “branqueamentos” dentários e outras ofensas ignóbeis que ferem o ego de Paulo Portas.
Num ataque de verdadeiro arrojo, este após se ter vitimizado perante o parlamento e as acusações infundadas de Jaime Silva, Paulinho muda a estratégia e eleva a conversa para o nível que lhe é familiar: faca na liga e conversa de mercado.
Diz, peremptoriamente, não o temer Sócrates, afirmação a que este responde, devolvendo a ameaça.
Se o país não queria conhecer tal facto, não pode, a partir de hoje e sem motivo que o justifique, ignorar. Contributo significativo para a evolução do país? Nenhum.
A última perplexidade do debate foi, como não poderia deixar de ser, a intervenção de Santana Lopes que em nome do PSD falou de ética e moral, recriminando as atitudes, pouco humildes, do primeiro-ministro.
Atravessará, o maior partido da oposição, um período tão negro, para represtinar o seu representante mais catastrófico de sempre?
São palavras simples. Pequenas, tamanho 11, um parágrafo e meio que chegam de manhã, ao final do dia, quando menos se espera, mas quando mais se precisa.
Que nos fazem escrever, querer publicar, dedicar energia e esforço a um projecto que há muito que deixou de ser nosso e ganhou vida própria.
São pequenos mimos, em forma de email, que alimentam a vida deste espaço. São visitas que regressam e prolongam a estadia.
Não é o número do contador de visitantes, mas sim a qualidade destes.
Hoje cruzei-me com uma senhora que sem pudor ou piedade, arrancava flores de um jardim público e gritava aos transeuntes infelizes que com ela se cruzavam, fados com letras de abandono, traição e desgosto.
Gritava com todo o fôlego dos seus pulmões, apregoando ao mundo jamais regressar ao homem que com razão abandonara.
Desconfiados, os presenteados com tal espectáculo, encolhiam os ombros à passagem e apelidavam-na de louca.
Sob a melodia que ecoava do ipod (baixinho, porque afinal sempre se estava a cantar o fado), ela não me pareceu louca, mas incrivelmente sã e possuidora de uma ternurenta beleza, pela forma descomplexada e sem melindres com que se expunha ao mundo.
Com a mesma música a pautar-me os movimentos, observei um estrangeiro, desses entre muitos que nos últimos anos vieram colorir Lisboa, que circulava de bicicleta à hora de ponta na Praça de Espanha, descontraído, sorridente e relaxado, imune aos olhares sanguinários de quem ao volante transporta uma jornada de trabalho.
A música retirou a pressa deste cenário quase idílico, com o pôr-do-sol ainda no horizonte, provocando a suspensão dos rasgos mais densos do dia e retirando, a toda a cena, os veios de loucura e desvario que a mesma, em circunstâncias normais, teria.
Afinal, pelo menos para mim, a música suave conseguiu parar a cidade, mas
esta, sem se dar conta, continuou-se a mexer.
"Recorda-me para que te conte a história do dia em que cedi ao capitalismo.
Hoje, não, que se faz tarde e tenho a vista cansada das luzes do computador."