Não sou artista, apesar de muitas vezes pensar que gostaría de o ser. Não possuo uma imaginação fora do comum ou a hipersensibilidade necessária à criação. E, talvez por não possuir essas caracteristicas, as invejo em terceiros.
Nenhuma peça de teatro me deixa indiferente, saio de todos os concertos a sonhar ser cantora e quando entro numa galeria de arte considero lamentável a minha inaptidão para o desenho e afins.
Ser artista, parece-me, ser um acto essencialmente de coragem e também por esse motivo me parece que careço das caracteristicas essenciais para o desempenho daquelas funções.
Só os corajosos ousam perseguir uma vida de incerteza, mas desse ponto de vista, também os arquitectos, os advogados e todos os demais trabalhadores independentes que acenam com recibos verdes arriscam percorrer esse trilho. Ainda assim, porém, estas profissões não despertam admiração ou pelo menos não nos deixam sonhar.
Os artistas são abismalmente corajosos porque se expõem, porque o seu trabalho se manifesta numa total e crua exposição das suas vulnerabilidades aos mundos de todos os outros, leigos ou não tanto, que indiferentes ao seu criador avaliam o trabalho final.
Independentemente das áreas, todos os criadores nos admitem as suas fraquezas, as suas alegrias e desgostos, os seus pensamentos eufemísticos ou nem tanto e para isso, para ser crú, para sair de si e mostrar o lado mais puro da alma, é essencial não ser temeroso.
Ser artista não para os que devem ser. Está reservado para os que são.
E ontem, o J. relembrou-nos que sempre o foi.