Caramel
Se ouvissemos dizer que "Caramel" era um filme sobre Beirute, certamente que esperariamos encontrar um retrato violento, cruel, inquietante. Provavelmente, se esse fosse o tema do filme, tê-lo-iamos visto de qualquer maneira, mas o sabor no final seria idêntico a muitos outros de idêntica estirpe: angustia, inquietação, desconforto e incredulidade perante uma descrição sanguinária que nós, felizardos habitantes de territórios sem conflitos armados, desconhecemos e preferimos remeter à ficção.
"Caramel", mais do que um retrato surpreendentemente singelo de Beirute, é uma história de mulheres do mundo. Mulheres vulgares, com existências anónimas e rotinas pacatas, com confissões idênticas às que ouvimos contar na esquina , na copa do escritório ou na padaria do bairro.
Mas as mulheres de "Caramel", embora obscenamente comuns, transportam nos seus pequenos nadas e trivialidades, o peso de uma tradição ancestral que, paradoxalmente, coabita e tenta encontrar um equilibrio num cenário de transição a costumes ocidentais, capitalistas e libertinos, furando as amarras de um passado castrador e uma sociedade impermeável à mudança.
Uma narrativa tocante, uma descrição despojada de pretensiosismo e carregada de sentimento , digna, certamente, de alguém que ama verdadeiramente a sua cidade e admira desmesuradamente as suas mulheres.